quinta-feira, 10 de março de 2011

Gentleman desdentado






























Assim como a Rue de la Plage pode ser mais um estado de ser do que um endereço, um verdadeiro gentleman nem sempre se apresenta como tal. Ele apenas é.

Em mais uma manhã friorenta e chuviscosa, saímos a pé do riad para visitar o Musée de la Kasbah, um museu muito pequenino, do qual eu não esperava grande coisa, mas que nos surpreendeu com informações e artefatos de todas as ocupações por que Tanger passou (romana, portuguesa, francesa e árabe) e dos tempos mais remotos, chegando à Idade da Pedra. Fora que o próprio prédio, um antigo palácio de um califa, é um dos mais bonitos e esmerados que vimos em todo o Marrocos.

Depois disso... lá fomos nós novamente em busca do endereço do Sirdar, já com a certeza de que a rua era mesmo a que pensávamos, apesar de ter agora outro nome. Mesmo assim, nada de casa no número 21. A essa altura já rolava novamente certa frustração, como é esperado (ou não?). O último recurso seria tentar falar com Bashir, para ver se ele havia descoberto algo, como eu havia pedido. Só que, para isso, eu teria que voltar todo o caminho até o riad para poder telefonar. Mas algo me dizia que nós iríamos encontrá-lo por ali.

Resolvemos dar um tempo (a la marroquina), sentados no mesmo restaurantinho onde o havíamos encontrado a primeira vez. Perguntei se sabiam dele. Não. Ficamos mais um tempo. Nada. Já estávamos desistindo quando ele apareceu. Havia pesquisado mas não sabia mais que nós, apenas confirmou nossa informação. Se ofereceu então para nos mostrar a tal da gruta (veja as fotos e o texto da Tania). Não nos desgrudamos mais.

Todo o tempo conversávamos como amigos interessados de verdade um no outro. Ele é muito culto, educado e gentil, apesar de viver por sua própria conta desde os 14 anos, quando começou a trabalhar como guia. Tem hoje 57 e fala seis idiomas. Ótimo papo.

Jantamos e fomos para o café que ele costuma frequentar, onde fuma um ou dois. E aí aconteceu um verdadeiro Encontro. A conversa seguia todo o tempo, sempre muito interessante, mas o que reinava era o silêncio interior.

Não sei se sou capaz de transmitir o meu encantamento. Ele, aparentemente um pobretão que literalmente não tem onde cair morto, mora numa pensão que paga a cada dia. Em sua boca só pude contar três dentes, um dos quais negro, os outros mais que amarelos. No entanto, sua presença é de uma nobreza que poucas vezes vi. É atencioso, sem ser tenso; cavalheiro sem jamais bajular. Um homem adulto e polido. Encontrar com ele poderia ter sido a única coisa desta viagem, e teria valido toda ela.
Gracias a la vida, que me ha dado tanto.

2 comentários:

Unknown disse...

Pooooooouuurrraaa, essas fotos realmente mataram a pau!!

Unknown disse...

Maravilloso!!!! Sin palabras... Gracias mis queridos! CD. Bea Juez